A Doutrina Espírita é eminentemente cristã. Segundo “O Livro dos Espíritos”, Jesus de Nazaré “é o ser mais perfeito que Deus nos ofereceu para servir de modelo e guia”. De fato, Jesus de Nazaré, à luz da Doutrina Espírita, é o Espírito mais elevado que já reencarnou na Terra. Portanto, sua moral é a mais evoluída, seus ensinamentos são os mais abrangentes e sua conduta é a mais espiritualizada que o homem terrestre pode almejar, tendo em vista os exemplos fornecidos por todos que já habitaram o nosso planeta.
Portanto, essa base fundamental, que está estabelecida na terceira parte de “O Livro dos Espíritos” (Das Leis Morais), constitui o alicerce conceitual no qual se erguerá a obra “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. Isso ocorre pois devemos estudar com profundidade o Evangelho de Jesus à luz do avanço intelecto-moral dos tempos atuais, incluindo as informações veiculadas pelo Espiritismo.
Entretanto, o conhecimento humano a respeito da verdadeira espiritualidade/religiosidade pode e deve evoluir além dos ensinamentos expostos por Jesus. Em primeiro lugar, ficar restrito a textos que foram submetidos a prováveis adulterações e erros de tradução é limitar o avanço real em busca da “Verdade que liberta”. Jesus era e é o Mestre por excelência, grande professor e governador da Terra que nos ensinou e ensina, constantemente, a caminhar para o Pai, a fim de atingir o Reino dos Céus. Obviamente, como grande professor, ele sabia que “luz demais ofusca, ao invés de iluminar” as consciências, implicando que não disse tudo, isto é, não ensinou tudo, como ele mesmo afirmou isso no Evangelho. O próprio Mestre explicou que o recurso didático das parábolas era utilizado em função da dificuldade da maioria das criaturas entenderem seus enunciados. Considerando a “Lei do Progresso” (vide “O Livro dos Espíritos”), através do mecanismo da reencarnação, Jesus sabia que muitos ensinamentos só seriam lenta e gradualmente assimilados pelos Espíritos em evolução. “Muito mais eu tenho para vos dizer, mas no momento não podeis suportar” disse-nos Jesus, permitindo inferir que, se “no momento” não podíamos suportar, poderíamos suportar no futuro. Portanto, as revelações são sucessivas e de acordo com a evolução intelecto-moral da humanidade através das experiências alternadas, ora no mundo espiritual, ora no mundo físico.
Portanto, o Espiritismo é eminentemente cristão, mas isso não quer dizer que restringe os estudos referentes à busca de espiritualidade/religiosidade à leitura do Evangelho ou da Bíblia somente. Além disso, para o Espiritismo, Jesus não é Deus, e a chamada “Santíssima Trindade” constitui crença completamente equivocada. Como se não bastasse, para o Espiritismo, as tradições cristãs têm muitas deturpações em relação à essência do pensamento do Mestre. Portanto, o que é tradicional não necessariamente é verdadeiro e não necessariamente merece consideração doutrinária de nossa parte. Dessa forma, muitos religiosos das doutrinas tradicionais não consideram o Espiritismo uma religião completamente cristã. Questionam o caráter cristão do Espiritismo baseados em seus próprios dogmas, que nada têm a ver com os ensinos propriamente de Jesus. Entretanto, o Espiritismo não perde nada com essa opinião, até porque não busca o reconhecimento enquanto movimento cristão por parte de outras correntes. Não se trata de tarefa nossa a modificação da mentalidade de outros movimentos.
Portanto, sigamos a Jesus e Kardec, estudando, sem preconceitos todos os conteúdos significativos visando ao nosso crescimento espiritual. O reconhecimento enquanto cristãos em nada acrescentaria à nossa evolução como movimento, e muito menos individualmente. Tal dificuldade somente demonstra o quão difícil é vencer preconceitos assim como o nível de afastamento da verdadeira essência do Evangelho de Jesus em que se encontram muitos dos chamados “membros do Cristianismo tradicional”.
Leonardo Marmo Moreira