Tanto
o excessivo rigor doutrinário como a ausência total de critério doutrinário são
negativos ao movimento espírita. Por motivos diferentes ambas atitudes tendem a
minar as resistências do grupo na execução do ideal superior associado à tarefa
desempenhada.
De qualquer
maneira, a ausência de critério doutrinário seria o pior cenário, pois
desvincularia a atividade em questão da doutrina espírita propriamente dita, ou
seja, tornaria tal trabalho algo “não-espírita”. Em atividades deste tipo, a
médio e longo prazos, os adeptos (pelo menos, aqueles que tem no próprio
trabalho a principal fonte de informação espírita) tendem a largar o trabalho
espírita, pois, muitas vezes sem perceberem, já deixaram o ideal espírita muito
antes. De fato, o ideal espírita, baseado em um legítimo amor à doutrina, é o
que move o indivíduo na busca por novos conhecimentos doutrinários. Isso tende
a gerar um círculo virtuoso, pois quanto mais ideal, mais estudo e trabalho e
quanto mais estudo e trabalho, mais espiritualidade e quanto mais
espiritualidade, mais ideal. Na verdade, quando o movimento não tem a doutrina
espírita como diretriz, paulatinamente, faz com que o componente que está
totalmente enquadrado nessa filosofia de trabalho vá deixando de ser espírita
(se é que um dia realmente foi, pois, para Kardec, em “Obras Póstumas”, os
chamados “desertores” do Espiritismo, em verdade, nunca foram realmente
espíritas). Portanto, quando as amizades escasseiam, os problemas de
relacionamento surgem, as mudanças de cidades minimizam o contato pessoal,
entre outros processos naturais que frequentemente ocorrem, os participantes do
trabalho tendem a se afastar da tarefa e não necessariamente buscarão outra
tarefa no movimento para substituí-la (pelo contrário, provavelmente não
procurarão outra atividade no movimento espírita), pois, no fundo, eles não têm
ideal espírita. Simplesmente estavam apegados àquela tarefa por uma associação
de fatores que favoreciam algum tipo de participação. E, nesse contexto, até
certo momento a inércia atua mantendo os indivíduos no trabalho, até que a
relação custo/benefício não seja mais vantajosa para a continuação do trabalho
em questão, o que frequentemente acontece para os indivíduos que não são
pessoas realmente espíritas. Não haverá, por conseguinte, um esforço, por parte
de “semi-convertidos” na manutenção de um trabalho complicado, pensando nas
implicações espirituais, nos compromissos pessoais, no desenvolvimento do
movimento espírita, entre outros fatores, pois esses fatores somente são
considerados e têm verdadeiro apelo para espíritas militantes.
Por
outro lado, se os espíritas conscientes forem excessivamente rigorosos na
imposição de metas doutrinárias criarão um ambiente de certa intolerância que
será mais nocivo do que benéfico ao movimento, pois a obra espírita é uma obra
de educação por excelência, e todo processo educativo demanda tempo para ser
empreendido. Realmente, a consciência espírita não será adquirida por decreto.
Logo, os
dirigentes espíritas têm graves responsabilidades na diretriz doutrinária que
empregam em seus trabalhos bem como na escalação da equipe para cada tarefa
espírita, pois os líderes do movimento são, em maior ou menor grau, formadores
de opinião, seja ela espírita ou não. Obviamente, ninguém é dirigente de
movimento espírita por acaso, e, todos os espíritas conscientes, dirigentes ou
não, terão que arcar com as consequências de suas atitudes dentro e fora do
movimento espírita, respondendo, por exemplo, pela sua influência doutrinadora
ou afastadora da doutrina em relação aos frequentadores de seus trabalhos.
Seria mais conveniente
sermos altamente exigentes conosco mesmos, tanto doutrinariamente como, sobretudo,
moralmente, e criteriosos para delegar funções (se estivermos em cargos de
direção) para confrades realmente comprometidos com a Doutrina Espírita
propriamente dita. Se o chamado “núcleo duro” do centro espírita ou evento
espirita a que nos dedicamos é formado por pessoas verdadeiramente espíritas, a
nossa atuação no movimento espírita poderá ser mais flexível, do ponto de vista
das metas doutrinárias, procurando o tão difícil objetivo do bom senso. Isso
porque o estudo doutrinário fluirá naturalmente das atitudes, comentários,
análises, citações e leituras de todos os componentes desse “centro de coesão
doutrinária”. Esse tipo de atuação permitiria um clima agradável no movimento
espírita, acessível aos neófitos, mas que direta e indiretamente demonstrasse,
de forma inequívoca, os fortes referenciais doutrinários do grupo, os quais não
podem jamais ser ignorados por todos os participantes, sem exceção, de
quaisquer grupos espíritas. De qualquer maneira, o grupo com maiores
responsabilidades saberá “cultivar a planta doutrinária nascente” nos corações
daqueles que estão lenta e gradualmente se inteirando dos princípios e ideias
espíritas.
Leonardo Marmo Moreira
Nenhum comentário:
Postar um comentário