“Àquele
que tem, mais será dado e àquele que não tem, até o que pensa ter, ser-lhe-á
tirado”.
Esse
interessante aforismo evangélico é ainda motivo de indagações profundas em
relação ao seu significado em termos de Lei de Causa e Efeito. Tal comentário
de Jesus necessita ser associado a conquistas de valores espirituais e não de
posses efêmeras, suscetíveis às alternâncias circunstanciais da vida material.
Quem
tem grande potencial, ou seja, um elevado talento intelecto-moral terá mais
condições de desenvolver obras de maior envergadura para o avanço espiritual
concomitante de si mesmo e da sociedade. Realmente, a Questão 132 de “O Livro
dos Espíritos” estabelece que as tarefas primordiais do esforço reencarnatório
consistem na própria evolução espiritual do Espírito reencarnado e, ao mesmo
tempo, na participação como colaborador da Obra da Criação. Logo, à medida que
evoluímos individualmente colaboramos com a evolução de todos a nossa volta,
uma vez que a nossa evolução dá-se através de contato social (Lei de Sociedade)
e dos esforços inerentes a essa interação (Lei de Trabalho, Lei de Justiça,
Amor e Caridade, entre outras). Esse raciocínio bem simples e acessível é
respaldado, inclusive, por outras passagens evangélicas como a própria
“Parábola dos Talentos”.
Ocorre,
porém, que vários indivíduos talentosos fracassam em suas tarefas
reencarnatórias. André Luiz, em sua obra “Os Mensageiros”, relata em vários
capítulos as experiências frustradas de companheiros que desencarnaram com
realização espiritual pífia. A intensidade do fracasso está relacionada à
capacidade do fracassado, ao tempo de preparo, às oportunidades disponíveis e a
relevância dos objetivos previamente traçados pelos próprios protagonistas
dessas vivências em colaboração com mentores espirituais extremamente preparados
e experientes. Ressalta-se que as tarefas destes casos supracitados estavam
centradas em trabalhos de cunho espiritual, destacando-se o papel de médiuns e
doutrinadores. Além disso, o autor espiritual, que havia sido médico na última
encarnação, analisa o próprio fracasso como ser humano de uma forma geral em
relação a outros médicos que fracassaram especificamente no desempenho da atividade
médica. Também é digna de registro a obra “Tormentos da Obsessão” (Manoel
Philomeno de Miranda/Divaldo Pereira Franco) que relata grande número de casos
envolvendo espíritas fracassados em suas reencarnações, os quais foram
socorridos no “Hospital Esperança” pelo Mentor Espiritual Eurípedes Barsanulfo
e sua equipe.
Em
muitos exemplos, as falências espirituais de criaturas talentosas acontecem,
pois, apesar de indiscutíveis conquistas prévias em determinada área, o
Espírito reencarnante traz falhas espirituais, sobretudo morais, que acabam
afetando o trabalho específico que ele deveria realizar, mesmo que esse
indivíduo tenha realmente imenso cabedal em certo setor evolutivo. Assim, as
diversas mazelas intelecto-morais em outras áreas do comportamento humano
dificilmente permitem que o candidato à realização espiritual consiga
manifestar plenamente seu talento, pois a indisciplina, a falta de força de
vontade e a ausência de ideal superior, entre outras características pessoais,
são tendências inferiores que limitam o desenvolvimento de maior amplitude de
tarefas. Até mesmo pequenos trabalhos podem ser comprometidos, pois traços de
personalidade inferior como a intolerância e a impaciência suprimem
frequentemente a manutenção de esforços de longo prazo, favorecendo o
desperdício de oportunidades.
É
importante frisar que “Deus não dá fardos pesados a ombros frágeis”,
significando dizer que, se o indivíduo fracassa, ele deve atribuir essa queda
espiritual à sua própria negligência, uma vez que o livre-arbítrio é alicerce
da Lei de Deus. No entanto, mesmo assim, estas experiências fracassadas, se bem
estudadas e assimiladas, podem trazer aprendizados que serão as bases para
realizações vitoriosas no futuro. Por isso, quando não pudermos realizar
totalmente nossas tarefas, tentemos, ao menos, realizar parcialmente, pois o
nosso futuro espiritual será construído a partir das nossas construções do
presente. “Todo esforço de hoje, é uma facilidade a sorrir amanhã”, nos ensina
Emmanuel na obra “Palavras de Vida Eterna”, implicando que todo tempo perdido
hoje, será sempre oportunidade de crescimento desperdiçada a ser lembrada no
dia de amanhã, quando as circunstâncias da vida podem não mais favorecer a
referida realização.
Quando
o indivíduo detém vários talentos, os quais são conquistas espirituais
pretéritas, essas potencialidades atuam sinergicamente, fomentando a
desenvolvimento de obras de maior complexidade. Em outras palavras, quanto mais
pré-requisitos intelecto-morais, maior a probabilidade de sucesso espiritual na
encarnação, uma vez que mais recursos o Espírito reencarnado terá para
“driblar” os obstáculos e as armadilhas do caminho existencial. Mesmo quando
fraqueja espiritualmente, é possível que consiga realizar significativa obra,
pois suas habilidades favorecem o surgimento e o aproveitamento de bom número
de oportunidades. Estes casos de Espíritos com grande capacidade que realizam
parcialmente as suas tarefas são muito interessantes, pois podem gerar
conflitos espirituais e complexos de culpa, mesmo quando tais companheiros são
altamente reconhecidos pelo que realizaram, especialmente na análise dos
encarnados. Acontece que o auto-exame sincero demonstra uma extensa perda de
oportunidades e até mesmo aquisição de débitos, os quais passariam praticamente
despercebidos se fossem associados a criaturas com menor cabedal espiritual.
Todavia, como a Lei de Deus está escrita na consciência da própria criatura, os
Espíritos em questão constatam que poderiam ter feito muito mais por si mesmos
e pela humanidade, pois o nível de consciência dessas criaturas já é bem
elevado.
Assim
sendo, quando nos sentimos detentores de poucos talentos, devemos ter alta
vigilância e disciplina, porque somente o foco, o esforço no trabalho e a
humildade frente às nossas fragilidades farão com que não “caiamos em
tentações”, não nos deixando levar por interesses tortuosos que nos desviem de
nossas tarefas principais, atrapalhando a manifestação de nosso talento
espiritual, que representa os dons divinos em nós.
Interessantemente,
a vigilância e a disciplina também são fundamentais quando alguns irmãos se
sentem detentores de grandes possibilidades, pois as responsabilidades são
evidentemente maiores (“Muito será cobrado a quem muito foi dado”). Os
Espíritos que já trazem um expressivo leque de habilidades podem,
eventualmente, deixarem-se levar por interesses, muitas vezes dignos, mas não
tão prioritários em relação aos compromissos assumidos previamente.
Neste
contexto, é muito sugestiva a famosa recomendação de Emmanuel em seu primeiro
contato com Chico Xavier, asseverando a relevância da disciplina nas tarefas
espirituais.
Sabendo-se
que “reconhece-se a árvore pelos frutos”, devemos nos auto-avaliar constantemente
para identificarmos as conseqüências concretas de nossas ações efetivas na vida
física. Se os efeitos dessas atitudes não têm representado valores do bem, da
utilidade e da verdade, devemos repensar os caminhos que estamos trilhando, sob
pena de nos vermos pelejando por questões com pouco valor espiritual em nossos
esforços diários.
“Reconhece-se
o verdadeiro Espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que
empreende para domar suas más inclinações”. Portanto, o verdadeiro Espírita
busca sua melhoria pessoal de forma sistemática, o que deve repercutir
diretamente nos sentimentos, pensamentos e atitudes de cada adepto do
Espiritismo, e, consequentemente, no aproveitamento das oportunidades
evolutivas e na construção da obra no bem.
Leonardo Marmo Moreira
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