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quinta-feira, 27 de novembro de 2014

O PENSAMENTO DE UBALDI E A DOUTRINA ESPÍRITA

Fazendo um estudo comparativo entre o pensamento de Pietro Ubaldi e a Doutrina Espírita, podemos identificar várias propostas bem como atitudes que denotam significativa discordância conceitual e/ou metodológica entre seus respectivos conteúdos. Vejamos alguns tópicos relacionados a essa discussão:
1)      Pietro Ubaldi até quase 50 anos ainda se considerava um "bom católico", e só passa a se afastar mais efetivamente da igreja católica quando o vaticano coloca suas obras “A Grande Síntese” e “Ascese Mística” no Index Librorum Prohibitorum. José Amaral (amigo pessoal e conhecido biógrafo de Pietro Ubaldi, em seu respectivo trabalho biográfico sobre Pietro Ubaldi, o qual encontra-se inserto como anexo na parte final da obra de Pietro Ubaldi “Grandes Mensagens”, publicado pela FUNDAPU) afirma que “quando A Grande Síntese foi colocada no Librorum Indice Prohibitorum, pela Igreja, sua dor foi titânica, porque ele amava aquele livro, revelado por Sua Voz. Tão grande fora seu desânimo que “decidiria quebrar a pena, renunciar a escrever, renunciar a compreender e, afinal, renunciar a pensar. Mas não compreendera que sua vontade não bastava e que não é possível, mesmo que se queira, sufocar o espírito”.  Apesar de tamanha decepção com a igreja católica, Ubaldi ainda vai se considerar um “franciscano” por toda a sua vida. Primeiramente, denominava-se católico até quase 50 anos e depois monista e/ou universalista, apesar de “franciscano”. Tal episódio demonstra a forte influência católica no pensamento do autor italiano. Pietro Ubaldi nunca se considerou Espírita.
2)      Ubaldi afirmou ter lido Kardec no ano de 1912 (curiosamente, ele comenta isso em palestra proferida em 1951 para público predominantemente espírita, destacando somente o caráter reencarnacionista do Espiritismo, como se esse tópico fosse a única informação que a Doutrina Espírita nos oferece). Todavia, até 1939, Pietro Ubaldi ainda se considerava um “bom católico”. Assim, a suposta leitura de Kardec não o tornou espírita, pois continuou católico praticante (inclusive com confessor) durante várias décadas (vide texto de José Amaral em “Grandes Mensagens”). Se Ubaldi leu Kardec, leu de forma superficial, ou, por outro lado, não concordou ou não se impressionou muito. Assim como acontece com muitos católicos no Brasil, Ubaldi teve acesso ao conteúdo espírita, passando a acreditar na reencarnação, mas sem qualquer compromisso com o estudo doutrinário espírita. Ubaldi era, no máximo, um simpatizante de algumas ideias do Espiritismo, e acreditava ter superado, e muito, a Obra Kardeciana.
3)      Pietro Ubaldi fez um curioso “voto de pobreza”, em 1927, quando seu pai desencarna. Em primeiro lugar, poderíamos questionar: “voto de pobreza” é atitude espírita? Em princípio, não. A Doutrina Espírita está muito mais sintonizada, nesse sentido, com o pensamento do Apóstolo Paulo: “Fazendo com as mãos o que for bom, para ter o que repartir com aquele que passa por necessidades”. Ou seja, os recursos materiais devem ser empregados para gerar obras e produções efetivas no campo do bem. É interessante registrar que Ubaldi, que nasceu em “berço de ouro”, não trabalhou de forma efetiva durante um largo intervalo de tempo (desde sua formatura em Direito em 1910 até ser nomeado professor de inglês na Sicília em 1931, o único “trabalho” efetivo que ele teve foi como motorista de veículos durante a Primeira Guerra Mundial, pois ele nunca assumiu, de fato, a administração das fazendas e demais propriedades e negócios de sua rica família[vide a supracitada biografia de Pietro Ubaldi elaborada por José Amaral e publicada pela FUNDAPU em anexo à obra “Grandes Mensagens”). Aliás, Ubaldi não se opôs a um casamento de interesses proposto por seus pais (vide biografia de Ubaldi por José Amaral, “Grandes Mensagens”; vide também “Para Entender Ubaldi” J. Damas Martins; Júlio Damasceno), no qual juntaram a sua fortuna com a fortuna de sua futura esposa (6 fazendas de um e mais 6 fazendas do outro). Em segundo lugar, no seu “voto de pobreza”, Ubaldi “abriu mão” dos seus direitos à herança paterna em benefício de sua esposa (casaram em regime de comunhão de bens) e dos seus filhos (os quais viveram com Ubaldi até a desencarnação do referido autor). Portanto, é pertinente um novo questionamento: Ubaldi realmente abriu mão de seus bens como ele e seus adeptos defendem para atribuírem a Ubaldi um suposto desapego material?!
4)      Segundo o biógrafo José Amaral, quando comenta sobre o quarto pessoal de Pietro Ubaldi (na referida obra biográfica), Ubaldi não tinha o hábito da leitura. Diz-nos José Amaral: “somente não havia lugar nesse quarto para livros de outros escritores, não havia nem mesmo uma prateleira destinada a livros que não fossem os seus e Ubaldi era um homem culto. Sua grande cultura provinha de outras vidas, da juventude e do período de maturação interior, espiritual. Agora, para escrever, não precisava mais de biblioteca, porque sabia ler no grande livro da vida e tinha o universo em suas mãos, através de sua poderosa intuição”. Em outras palavras, Ubaldi não lia coisa alguma. Como ele e seus adeptos podem achar que existe algo de científico em alguém que não lê nada, além de suas próprias obras? E, ademais, se ele fosse minimamente espírita, não teria que estudar com alguma freqüência as obras de Kardec e outras obras doutrinárias?! Os médiuns espíritas não são constantemente convocados ao estudo doutrinário, ao estudo de si mesmo, e ao estudo de outras obras respeitáveis a respeito do Espiritualismo e do Espiritismo?! Até médiuns que não se consideram espíritas estudam, o que, aliás, é muito louvável. Como “ele tinha o universo em suas mãos”, não precisava estudar?! Trata-se de atitude vaidosa e muito infeliz. Qualquer indivíduo minimamente esclarecido sabe que temos que estudar a vida toda, em um processo conhecido atualmente como “educação continuada”. Será que alguém com pretensão apostólica e revolucionária em termos evolutivos não tinha conhecimento disso?
5)      Ubaldi, em toda a sua obra, considera a vida física na Crosta um verdadeiro “inferno terrestre”. Tal postura contrasta grosseiramente com a visão positiva que a Doutrina Espírita apresenta a respeito da Reencarnação e de suas respectivas lutas evolutivas, as quais consistem em mecanismos da Lei de Progresso atuando em nosso próprio benefício.
6)      Pietro Ubaldi está sempre enfatizando, em todos os seus 24 livros, que sua vida física foi um terrível “martírio”, vivendo com intensa “dor”, em todas as fases de sua longa vida de 85 anos e alguns meses. O que nós, Espíritas, aprendemos com Allan Kardec, Léon Denis, Gabriel Delanne, Eurípedes Barsanulfo, Chico Xavier, Yvonne Pereira e tantos outros notáveis autores espíritas é que devemos amar a vida física, aprendendo a não hipervalorizar os problemas pessoais, sabendo que muitas vezes outros que estão à nossa volta sofrem muito mais e não comentam suas próprias lutas e dores (vale a pena ler o texto “O Bem e o Mal Sofrer”, inserto no Capítulo V – “Bem-Aventurados os Aflitos”, de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”). Enfrentar a luta da vida física com atitude elevada espiritualmente também significa lamentar menos, sem hipervalorizar seus próprios problemas, aprendendo a esquecer nossas próprias dores através do trabalho contínuo de auxílio aos nossos irmãos. Ubaldi só escreve sobre si mesmo e passa a impressão de ser o indivíduo mais sofredor do mundo. Tamanho nível de conflito íntimo não parece ser característica espiritual de grandes missionários do bem, ainda mais se lembrarmos que Ubaldi achava que era a reencarnação do “Apóstolo Simão Pedro”. Se lermos a obra de André Luiz, perceberemos que excessiva lamentação é típica de Espíritos que ainda estão longe de serem considerados mentores espirituais. O próprio André Luiz é por diversas vezes advertido sobre essa atitude na sua primeira obra “Nosso Lar”. Para encerrar esse tópico, poderíamos questionar: Chico Xavier costumava reclamar muito de sua vida material? E a vida de Chico Xavier foi pouco desafiadora em termos de dificuldades e lutas? Não é a resposta para as duas questões. O modus vivendi de Pietro Ubaldi é o oposto daquele característico de Chico Xavier. Quem estaria em coerência com o Evangelho de Jesus? É evidente que Chico Xavier. Nesse contexto, vale lembrar as recomendações do Apóstolo Paulo: “Regozijai-vos sempre!”; e “Aprendi a não mais ir ter convosco em tristeza”. Como nos ensina Divaldo Franco (Palestra e “Pinga-Fogo” desenvolvido no início de 1990 no Centro Espírita Meimei, no ABC paulista intitulado “A Casa Espírita”) “eu não posso crer no dia e na noite na mesma situação, no mesmo momento e no mesmo local. Como eu creio em Kardec, o outro deve estar errado. Porque eu creio em Kardec por opção pessoal...”.
7)      Além de se achar a reencarnação do “Apóstolo Pedro”, Pietro Ubaldi e seus discípulos consideram que a obra de Ubaldi veio diretamente de Cristo e que sua missão é a maior da história da humanidade desde Francisco de Assis. Entretanto, o conteúdo das mensagens de “Sua Voz” (supostamente Jesus de Nazaré) é muito fraco, vaidoso e repetitivo, sendo inadmissível considerar Jesus ou qualquer Espírito da “Falange do Espírito da Verdade” seu autor. Erasto na mensagem “Caracteres do Verdadeiro Profeta”, inserta em “Instruções dos Espíritos” (Capítulo 21 – “Falsos Cristos e Falsos Profetas” de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”) ensina-nos:
Outra consideração a fazer é a de que a maior parte dos verdadeiros missionários de Deus ignoram que o sejam. Realizam aquilo para que  foram chamados, graças ao poder de seu próprio gênio, secundados pelo poder oculto que os inspira e os dirige, à sua revelia, e sem que o tivessem premeditado. Numa palavra: os verdadeiros profetas se revelam pelos seus atos e são descobertos pelos outros, enquanto os falsos profetas se apresentam por si mesmos como enviados de Deus. Os primeiros são humildes e modestos; os segundos, orgulhosos e cheios de si, falam com arrogância, e como todos os mentirosos, parecem sempre receosos de não serem aceitos. Já se viram desses impostores apresentarem-se como apóstolos do Cristo, outros como o próprio Cristo, e, para vergonha da humanidade, encontraram pessoas bastante crédulas para aceitarem as suas imposturas. Uma observação bem simples, entretanto, bastaria para abrir os olhos aos mais cegos: se o Cristo reencarnasse na Terra, o faria com todo o seu poder e todas as virtudes, a menos que se admita, o que seria absurdo, que ele houvesse degenerado. Ora, da mesma maneira que se tirarmos a Deus um dos seus atributos, já não teremos Deus, se tirarmos uma só das virtudes do Cristo, não mais o teremos.
Esses que se apresentam como o Cristo revelam todas as suas virtudes? Eis a questão. Observai-os, sondai-lhes os pensamentos e os atos, e verificareis que lhes faltam sobretudo as qualidades distintivas do Cristo: a humildade e a caridade, enquanto lhes sobram as que ele não tinha: a cupidez e o orgulho. Notai ainda que neste momento existem, em diversos países, muitos pretensos cristos, como há também numerosos e pretensos Elias, supostos São João ou São Pedro, e que necessariamente não podem ser todos verdadeiros. Podeis estar certos de que aos exploradores da credulidade, que acham cômodo viver às expensas daqueles que lhes dão ouvidos”.
8)      O seguinte comentário de Erasto também está inserto em “Instruções dos Espíritos” (Capítulo 21 – “Falsos Cristos e Falsos Profetas” de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”) em uma outra mensagem denominada “Os Falsos Profetas da Erraticidade”. Essa análise bastante contundente também ajuda-nos na conscientização da necessidade de criteriosa avaliação do conteúdo obtido mediunicamente. Erasto esclarece-nos: “Os Espíritos da ordem a que eles dizem pertencer, devem ser não somente muito bons, mas também eminentemente racionais. Pois bem: passai os seus sistemas pelo crivo da razão e do bom-senso, e vereis o que restará. Então concordareis comigo em que, sempre que um Espírito indicar, como remédio para os males da Humanidade, ou como meios de realizar a sua transformação, medidas utópicas e impraticáveis, pueris e ridículas, ou quando formula um sistema contraditado pelas mais corriqueiras noções científicas, só pode ser um Espírito ignorante e mentiroso” (Erasto, Discípulo de Paulo, 1862). O próprio Codificador do Espiritismo Allan Kardec elaborou um capítulo em “O Livro dos Médiuns” para comentar sobre mensagens que ele recebera e que eram indignas de serem da autoria dos supostos mentores espirituais que as assinaram, alertando-nos quanto aos perigos da mediunidade. Kardec ensina-nos a avaliar rigorosamente o conteúdo das mensagens de origem mediúnica, hábito não cultivado por Ubaldi.
9)      Pietro Ubaldi é médium de um Espírito só. Ele só recebeu mensagens de “Sua Voz” durante toda a sua vida. Isso é muito estranho. Também no capítulo 21 “Falsos Cristos e Falsos Profetas” de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, entre outras passagens, a Codificação ensina-nos que essa é uma característica de médiuns que estão assessorados por Espíritos mistificadores. Se avaliarmos os principais médiuns do Movimento Espírita, tais como Chico Xavier, Divaldo Pereira Franco, Yvonne do Amaral Pereira, entre outros, identificaremos grande número de Espíritos comunicantes e com obras com características e propostas bem distintas (portanto, cada Espírito escreve segundo seu estilo pessoal). Aliás, mesmo médiuns com tarefas de menor projeção costumam receber diferentes Espíritos. Ubaldi não apenas recebe comunicações de um único Espírito, como esse Espírito seria o próprio Jesus. Segundo a Doutrina Espírita, tal situação pode sugerir fascinação. Divaldo Franco e Júlio César Grandi Ribeiro comentam em várias oportunidades sobre a intensa atuação de Chico Xavier em reuniões de desobsessão, recebendo mensagens psicofônicas de Mentores Espirituais no início e/ou no fim das reuniões e de grande número de Espíritos obsessores durante o transcurso das reuniões de intercâmbio com Espíritos sofredores.
10)   O próprio encontro entre Pietro Ubaldi e Chico Xavier, em 1951, demonstra que Pietro Ubaldi é médium de somente um Espírito: “Sua Voz”. Na presença de Chico Xavier (no Centro Espírita Luiz Gonzaga, em Pedro Leopoldo-MG), Ubaldi recebe mensagem psicográfica de “Sua Voz”. Enquanto isso, Chico Xavier recebe mensagens psicográficas de Francisco de Assis e de Emmanuel e mensagens através de sua vidência e audiência de grande número de Espíritos familiares de Pietro Ubaldi que já tinham desencarnado, para surpresa do autor italiano. Por que Ubaldi não percebeu esses Espíritos? E não notou nenhuma outra entidade? Isso ocorre porque Ubaldi não era um “médium de ação”, ou seja, não tinha uma mediunidade significativa, apesar dos seus adeptos afirmarem ser ele “a maior antena psíquica do século XX” (“Para Entender Ubaldi”/J. Damas Martins; Júlio Damasceno). Portanto, essa “exclusividade” autoral concernente ao Espírito “Sua Voz” sugere fortemente que Ubaldi nunca foi um médium ostensivo (o que também fica evidente ao se estudar outras passagens da vida e da obra de Pietro Ubaldi) e não era cuidadoso na avaliação do conteúdo da mensagem que ele gerava, pois, caso contrário, ele deveria ficar surpreso por somente receber mensagens de um único Espírito. É evidente que Ubaldi elaborou uma obra que possui fortíssimo componente anímico, através de grande auto-sugestão, o que pode ser atribuído à sua vontade de ser médium e à ausência de estudo a respeito dos problemas e riscos que o trabalho mediúnico e/ou espiritual apresenta para aqueles que não se preparam convenientemente para superá-los.
11)   A mensagem de Emmanuel dirigida a Pietro Ubaldi no encontro entre Chico Xavier e Ubaldi, em 1951, é um grande alerta a Ubaldi sobre o significado do Espiritismo para os homens na Terra, como legítima revivescência do Evangelho de Jesus. Aparentemente, Ubaldi não se sensibilizou significativamente, preferindo continuar sua “carreira-solo”, desenvolvendo um trabalho a parte da Doutrina Espírita.
12)   Ubaldi defende o chamado “Monismo”, que seria uma espécie de panteísmo, no qual matéria e espírito seriam interconversíveis, estando ambos “mergulhados em Deus”. Do ponto de vista espírita são dois equívocos: a interconversão entre matéria e espírito; e a visão panteísta de Deus. A Doutrina Espírita estabelece uma proposta dualista, na qual espírito (ou princípio espiritual) e matéria (ou princípio material) são realidades totalmente distintas, embora interagentes (vide Primeira Parte de “O Livro dos Espíritos”). Além disso, “O Livro dos Espíritos” rejeita categoricamente a idéia panteísta, estabelecendo que Deus (“A inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”), Espírito e Matéria são totalmente independentes (vide, igualmente, Primeira Parte de “O Livro dos Espíritos”).
13)   Admitir a Queda Espiritual é rejeitar Allan Kardec. Entretanto, nossas heranças religiosas associadas à interpretação literal do “Gênesis” ainda dificultam o entendimento doutrinário. Léon Denis afirma em “Cristianismo e Espiritismo” que os erros na interpretação do “Gênesis” constituem causa de uma série de doutrinas equivocadas no Cristianismo e no Espiritualismo de uma forma geral. Severino Celestino e Pastor Nehemias Marien também corroboram essa opinião de Denis. Obviamente, as fortes contaminações católicas na formação dos pseudo-espíritas e semi-espíritas vêm sendo um problema no movimento espírita. Entretanto, no caso de Ubaldi, a problemática adquire maiores proporções. De qualquer forma, Ubaldi nunca disse que sua obra era espírita. Nesse contexto, o erro maior, indiscutivelmente, é dos Espíritas que tentam “forçar” o reconhecimento da obra de Pietro Ubaldi como “obra espírita”. Por outro lado, apesar de Ubaldi não considerar sua obra espírita, tem a atitude contraditória de sugerir que os Espíritas incorporem suas obras no corpo doutrinário espiritista, proposta que foi contundentemente rejeitada por renomados espíritas, como é o caso do Professor J. Herculano Pires.
14)   Poderíamos reconhecer algum valor relativo na obra de Ubaldi, pois o fato de ser obra espiritualista, e não espírita, não retira do autor italiano eventual mérito que sua obra possa apresentar. Aliás, muitos autores espiritualistas são respeitados e até mesmo admirados no meio espírita. Daí, a considerá-lo “autor espírita” e, para alguns, “renovador” e ou “reformador” de Kardec vai uma grande diferença. De qualquer maneira, para um autor fornecer contribuição ao Movimento Espírita, sua obra precisa estar em coerência com os postulados básicos da Doutrina Espírita e ser chancelada pela “Universalidade do Ensino dos Espíritos”. Isso ocorre porque Espírito Superior não conta mentira! Espírito Superior comenta aquilo que conhece profundamente. Se não conhece, não comenta, ou comenta dentro dos limites do seu conhecimento, pois, afinal, não são levianos, e não vão se arriscar a ensinar algo errado a seus irmãos. Assim, o médium preparado intelecto-moralmente poderá conseguir uma boa “filtração” da mensagem dos Espíritos Superiores, contribuindo com a chegada até nós, encarnados, de conteúdos que realmente nos iluminem com a Verdade. Tais conteúdos, por diferentes Espíritos, diferentes médiuns (todos elevados intelecto-moralmente) e diferentes grupos, tendem a se confirmarem mutuamente. Entretanto, a obra de Ubaldi não é corroborada por autores espíritas respeitáveis, encarnados ou desencarnados.
15)   Pietro Ubaldi não era cuidadoso com o fenômeno mediúnico e baseava suas conclusões em meras suposições. As ideias de “Queda Original” e de que nosso Universo é um “Anti-sistema” não apresentam nenhuma confirmação por autores respeitáveis, sejam eles encarnados ou desencarnados.
16)   Na sua obra final intitulada “Cristo”, Ubaldi defende que Jesus sofreu na sua Paixão, Crucificação e Morte, pois era um “Espírito decaído” e só voltou para o Reino dos Céus, o que Ubaldi denomina “Sistema”, após o sofrimento final do Julgamento, Crucificação e Morte. Portanto, Jesus sofreu porque estava expiando sua “rebeldia” e como uma espécie de “anjo decaído”, ainda precisava terminar de pagar por seus erros. Essa espécie de “pagamento de pecados” só foi completada, segundo Ubaldi (vide sua obra “Cristo”), após sua morte física na cruz, para que só então Jesus pudesse voltar ao “Sistema”, isto é, à condição de habitante do “Reino dos Céus”, na concepção ubaldista. Essa visão a respeito de Jesus discorda fortemente de todos os autores respeitáveis do Espiritismo, encarnados e/ou desencarnados, não sendo corroborada por nenhuma obra representativa associada à Doutrina Espírita. Todos estariam errados e “Sua Voz”/Ubaldi estaria certo?! Provavelmente, não. Portanto, novamente Ubaldi não possui o respaldo da “Universalidade do Ensino dos Espíritos”.
17)   Sistematicamente, Ubaldi tenta atribuir um caráter científico à sua obra, o que não tem nenhum fundamento, pois ele não aplicou nenhum método de avaliação da mensagem e nenhum tipo de avaliação do que escrevia. Aliás, considerava isso dispensável, pelo menos no que diz respeito à obra “A Grande Síntese” (vide seu comentário em “Nova Civilização do Terceiro Milênio”), a qual, para Ubaldi, era “irretocável”.

Portanto, não há sustentabilidade doutrinária na tentativa de inserção da obra de Pietro Ubaldi como obra subsidiária do Movimento Espírita.

Leonardo Marmo Moreira

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

PIETRO UBALDI SERIA UM AUTOR ESPÍRITA?

                Pietro Ubaldi (nascido em 18 de Agosto de 1886 em Foligno na Itália e desencarnado em 29 de Fevereiro de 1972, aos 85 anos) foi um autor italiano, que se fixou no Brasil no início da década de 50, e que recebeu substancial atenção por parte do Movimento Espírita Brasileiro. Suas obras foram significativamente difundidas no meio espírita, tendo sido publicadas, inclusive, pela própria Federação Espírita Brasileira (FEB) (trata-se de “A Grande Síntese” obra de 1932, que a FEB publicou em 1939, traduzida ao português por Guillon Ribeiro). Realmente, a comunidade espírita representou, e ainda representa nos dias atuais, a majoritária parte do público leitor das obras de Pietro Ubaldi.

O conteúdo da obra de Pietro Ubaldi, que abrange 24 livros, sua metodologia de trabalho, assim como sua atitude perante as questões espirituais, o Movimento Espírita e a sociedade em geral constituem materiais para análise que fornecem subsídios para nossa reflexão, visando responder à pergunta título desse artigo. Vejamos, portanto, alguns tópicos concernentes aos três ângulos da questão:

1)      Pietro Ubaldi já era um homem de meia idade (45 anos), quando recebeu, em princípio através de sua mediunidade intuitiva, a primeira mensagem da entidade que se denominou “Sua Voz”. Segundo Doutor Bezerra de Menezes, através da mediunidade de Yvonne Pereira, os médiuns mais confiáveis, a priori, seriam aqueles que apresentaram sua faculdade de forma ostensiva desde a primeira infância, pois, nestes casos, tal tarefa já teria sido planejada e preparada muito antes da atual encarnação. Esse não é o caso de Pietro Ubaldi. O recebimento da sua primeira mensagem de origem espiritual ocorreu no Natal de 1931 e a mensagem é intitulada “Mensagem do Natal”. Tal mensagem seria incluída no livro “Grandes Mensagens”. Vejamos o primeiro parágrafo de “Sua Voz”:
“No silêncio da Noite Santa, escuta-me. Põe de lado todo o saber e tuas recordações; põe-te de parte e esquece tudo. Abandona-te à minha voz; inerte, vazio, no nada; no mais completo silêncio do espaço e do tempo. Neste vazio, ouve minha voz que te diz - ergue-te e fala: Sou eu”.

                Essas recomendações de “Sua Voz” estão em clara oposição com tudo o que Allan Kardec e a Doutrina Espírita nos ensinam sobre a atitude que o médium deve ter em relação à mensagem mediúnica.
A ordem “Põe de lado todo o saber e tuas recordações; põe-te de parte e esquece tudo. Abandona-te à minha voz”, sugere fortemente que o médium não deveria utilizar de qualquer tipo de avaliação crítica em relação ao conteúdo da mensagem a ser recebida. Durante o processo de recepção mediúnica propriamente dita é natural que tal atitude de “passividade” seja compreensível, mas de forma nenhuma essa deve ser a atitude na avaliação da qualidade da mensagem, depois de seu recebimento. Essa recomendação é a antítese da recomendação que Emmanuel faz a Chico Xavier, quando de sua primeira aparição ao médium de Pedro Leopoldo: “Chico, se algum dia, algo que eu te disser estiver em oposição a Jesus e a Allan Kardec, você deverá me deixar e ficar com Jesus e Allan Kardec”. O médium que não submete o conteúdo de origem mediúnica à avaliação crítica está muito predisposto à fascinação, ou seja, a hipervalorizar o conteúdo da mensagem que recebe bem como a evolução espiritual do(s) Espírito(s) comunicante(s). Entretanto, esse tipo de avaliação do conteúdo da mensagem não era algo a que Ubaldi estivesse atento, uma vez não se considerava um Espírita militante, e, portanto, não se sentia comprometido com as diretrizes kardecianas. Na melhor das hipóteses, Ubaldi tinha lido, de passagem, algumas obras espíritas, sendo, no máximo um simpatizante de algumas idéias espiritistas.

2)      A obra de Ubaldi tinha um certo caráter messiânico, não estando sujeita a qualquer avaliação, principalmente no que era atribuído à “Sua Voz”, conforme o próprio Ubaldi assevera no prefácio da obra “A Nova Civilização do Terceiro Milênio”. Diz Ubaldi sobre “A Grande Síntese”:
“Este não é livro que se possa retocar, corrigir, cujo texto se possa ampliar, enxertando-lhe digressões, conceitos novos. Nasceu de um jato, em um dado momento histórico, com determinada função social e espiritual, através de particular estado psicológico de intuição. Condicionado por esses elementos especiais e irreproduzíveis, conservou-se inalterável, como se vasado em bronze, inviolável e firme, qual rochedo que desafia as tempestades dos séculos”.
Portanto, Ubaldi dá um caráter de “texto sagrado” à sua obra “A Grande Síntese”, fazendo dela uma espécie de “palavra de Deus”, algo que denota um misticismo exagerado, tornando tal livro algo que não poderia ser questionado. Lembra a visão fanática de algumas religiões cristãs em relação à Bíblia e a interpretação literal que tais grupos religiosos apresentam em relação aos textos bíblicos. Ubaldi mostra-se muito contraditório, pois considera seu trabalho algo altamente científico, mas age como um religioso fanático, sem nenhum tipo de metodologia ou critério de avaliação científica do conteúdo recebido intuitivamente. Nada perto da avaliação efetuada sistematicamente por Allan Kardec, incluindo o “Controle Universal do Ensino dos Espíritos” proposto pela Codificação. De fato, o posicionamento de Ubaldi é muito diferente da postura de Allan Kardec, que deixou claro que se, em algum momento, a ciência deixasse evidente algum erro conceitual no Espiritismo, o movimento espírita deveria deixar esse conceito equivocado e seguir com a Ciência. Ubaldi considerava “A Grande Síntese” irretocável.
Há outras evidências de que a atitude ubaldiana difere do modus operandi de Allan Kardec. De fato, a segunda edição (que se tornou a edição definitiva) de “O Livro dos Espíritos” foi amplamente revisada e ampliada em relação à primeira edição. Com “O Livro dos Médiuns” também é feita uma ampla revisão para a segunda edição, que também passa a ser a versão definitiva desta obra, sem significar, no entanto, que devemos considerá-lo um “texto irretocável”, o que retiraria da Doutrina Espírita seu aspecto científico.

3)      O segundo parágrafo da “Mensagem de Natal” de autoria de “Sua Voz” é o seguinte:

“Exulta pela minha presença: grande bem ela é para ti; grande prêmio que duramente mereceste. É aquele sinal que tanto invocaste deste mundo maior em que vivo e em que tu creste. Não perguntes meu nome; não procures individuar-me. Não poderias; ninguém o poderia. Não tentes uma inútil hipótese. Sabes que sou sempre o mesmo”.


        “Exulta pela minha presença: grande bem ela é para ti; grande prêmio que duramente mereceste...” também denota sério perigo, pois o Espírito comunicante exalta tanto a própria personalidade assim como a personalidade do médium. Ele tanto se auto-elogia como elogia o médium. Esse tipo de abordagem vai se repetir em toda a obra de Ubaldi. “Sua Voz” sempre exalta o sofrimento, as dores, a renúncia, a missão etc. pertinentes à vida de Ubaldi. A promoção da vida e da obra de Ubaldi consiste em um dos temas centrais da própria obra de Ubaldi. Poderíamos reflexionar: Nós observamos esse tipo de comentário nos Espíritos que orientaram Kardec? E nos Espíritos que orientaram Chico Xavier? E nos Mentores Espirituais que se comunicaram através de Yvonne Pereira?  E nos Guias Espirituais que trouxeram mensagens através de Divaldo Franco? Obviamente, a resposta para todos esses outros médiuns é não. “Sua Voz” e Ubaldi devem ter esquecido de que “aquele que se humilha será exaltado e aquele que se exalta será humilhado”.
É aquele sinal que tanto invocaste deste mundo maior em que vivo e em que tu creste”. Parece que Ubaldi “invocava” sistematicamente o “mundo maior”, o que também é percebido em outras passagens. O Professor Herculano Pires diz: “Evoque uma pedra, e ela atenderá”. Quem evoca excessivamente o mundo espiritual, quer muito obter uma mensagem e tende a acreditar, sem análise crítica, em tudo o que está registrado na referida mensagem. Chico Xavier dizia: “O telefone toca de lá para cá”. Não devemos forçar o intercâmbio espiritual. A comunicação que surge com espontaneidade, pode ser mais bem avaliada e corre menos risco de sofrer processos anímico-mistificadores.

4)      Aparentemente, Ubaldi começa a acreditar que sua missão é a maior de todas nos últimos séculos. Algo totalmente sem precedentes, desde Jesus e Francisco de Assis. Passa, inclusive, a acreditar ser a reencarnação do “Apóstolo Pedro”. De fato, grande número de discípulos de Ubaldi considera que “Sua Voz” é o próprio Jesus. Vejamos o motivo em mais uma mensagem obtida em data que corresponde à importante efeméride católica:

“Sua Voz” diz na última frase da “Mensagem do Perdão” (2 de agosto de 1932, dia do Perdão da Porciúncula " de São Francisco: “Porque eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”.
        Portanto, “Sua Voz”, em um primeiro momento recomenda “Não perguntes meu nome; não procures individuar-me. Não poderias; ninguém o poderia. Não tentes uma inútil hipótese. Sabes que sou sempre o mesmo”. Todavia, em um segundo momento, muda de idéia, e resolve sugerir que é Jesus (“Porque eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”).


5)      A segunda mensagem de Pietro Ubaldi recebeu o sugestivo título de “Mensagem da Ressurreição”, a qual, curiosamente, foi recebida na páscoa de 1932. Parece que a entidade comunicante, não satisfeita em utilizar expressões católicas, somente atua em “dias santos” e datas festivas católicas. Vejamos os parágrafos sétimo e oitavo da referida mensagem:
“A quem sofre eu digo: “Coragem! És um decaído que na sombra reconquista a grandeza perdida”.
É a justa reação da Lei que livremente transgredistes e que exige o retorno ao equilíbrio; instrumento de ascensão, a dor vos aponta o caminho de que fugistes; impõe-vos reabrirdes vossa alma, fechada pelas alegrias fáceis que infelizmente vos cegam, para que alcanceis júbilos mais altos e verdadeiros. A dor é uma força que vos constrange a refletir e a buscar em vós mesmos a verdade esquecida. É imposição de um novo progresso”.
À luz da Doutrina Espírita, o conteúdo agora fica completamente comprometido. As mensagens começam a defender que quem sofre é um Espírito “decaído”. De fato, a chamada “Queda Espiritual” vai ser pregada em toda a obra de Pietro Ubaldi (vale destacar a obra que recebe o impactante título “Queda e Salvação”). Esse ponto chave está em brutal oposição a toda a obra da Codificação Espírita, que combateu sistematicamente as ideias de “anjo decaído”, “reencarnação como castigo (exclusivamente para Espíritos falidos)”, “regressão espiritual”, “metempsicose” etc.
Se “Sua Voz” é Jesus ou algum Espírito de altíssima evolução, como pode discordar tão fortemente do que “A Falange do Espírito de Verdade” enunciou na Codificação Kardeciana sobre um princípio básico da Lei de Deus?!

6)      Ubaldi fica arrasado quando suas obras “A Grande Síntese” e “Ascese Mística” são colocadas no Index Librorum Prohibitorum da Igreja católica, em 1939. Cabe a pergunta: Um espírita se surpreenderia com isso, em plena década de 30?! E, o que é pior, um espírita de fato ficaria tão chocado com isso? Por um acaso, ele pretendia que suas obras fossem adotadas pela igreja católica?!

7)      Apesar de, a priori, Ubaldi ter afirmado que lera algumas obras de Allan Kardec, Ubaldi não as lia com frequência e muito menos outras obras subsidiárias da Doutrina Espírita. A única exceção (em termos de leitura, não de leitura assídua) teria sido “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho” (Humberto de Campos/Francisco C. Xavier). Além disso, Ubaldi jamais se considerou espírita, e nunca frequentou com assiduidade o Movimento Espírita, jamais se integrando ao Movimento Espírita Brasileiro, por mais que essas oportunidades lhe fossem sempre renovadas. Ubaldi pretendia criar um movimento próprio, que seria conhecido como “Monismo” ou “Universalismo”, entre outras denominações. Contudo, Ubaldi foi apoiado por Espíritas, desde seu tempo de Itália. Recebeu cartas estimuladoras de Ernesto Bozzano e recebeu a visita de Silvino Canuto Abreu, que lhe informara que o autor italiano usufruía de grande número de leitores entre os Espíritas brasileiros. Ubaldi torna-se correspondente de Clóvis Tavares, que organiza sua grande viagem ao Brasil em 1951, na qual Ubaldi profere muitas conferências para um público com grande presença de espiritistas. Aos poucos, Ubaldi percebe que seu público é basicamente constituído de espíritas brasileiros, mas, mesmo assim, não se sensibiliza em procurar uma maior integração com o movimento. Portanto, muitos espíritas haviam escolhido ler Ubaldi, apesar de Ubaldi não ter escolhido ser espírita.

8)      No Brasil, Ubaldi vive de sua aposentadoria como professor e dos direitos autorais da sua obra. Essa é realmente uma informação chocante! A obra de Ubaldi, em princípio de origem mediúnica-inspirativa, gerava dinheiro para o próprio Ubaldi. Ora, será que Ubaldi não sabia que a mediunidade com Jesus deve ser exercida gratuitamente?! Será que ele não sabia que o trabalho espiritual não deve gerar dinheiro para os seus agentes?! Será que Ubaldi não sabia que “de graça deve ser dado, o que de graça foi recebido”?! E onde estava “Sua Voz”, que não o alertou?! Será que ele, apesar de ter visitado por duas vezes Chico Xavier em Pedro Leopoldo não procurou seguir o exemplo de desapego e desinteresse material do médium mineiro?! Será que os espíritas leitores de Ubaldi achavam e acham isso normal?! Consideram essa atitude coerente com a Doutrina Espírita?! Não procuraram alertar o autor italiano quanto a isso?!

9)      Apesar de utilizar dos direitos autorais de sua obra, tais recursos não cobriam 20% dos seus gastos mensais. E Ubaldi não conseguia cumprir com seus compromissos materiais por meio de sua aposentadoria como professor e dos direitos autorais de sua obra “espiritual”. Tanto que em 1955 recebeu uma ordem de despejo do apartamento em que residia em São Vicente-SP. O problema foi contornado porque Benedito Zancanner doou o dinheiro necessário para comprar outro apartamento semelhante àquele em que morava. O problema imediato foi resolvido, mas Ubaldi voltou a ter sérias dificuldades financeiras (mesmo tendo ganhado um apartamento!) no biênio 1962-1963. Surpreendentemente, Ubaldi publica um “Apelo ao Mundo”, pedindo dinheiro a todos os seus admiradores para que ele conseguisse manter sua família, e, consequentemente, sua obra não sofresse solução de continuidade! Portanto, não há dúvida de que o trabalho espiritual de Ubaldi era fonte direta e indireta de renda para a manutenção material de si mesmo e de sua família. Definitivamente, Ubaldi não era um médium e/ou autor espírita!

10)   No segundo semestre de 1963, por ocasião do Congresso Espírita Pan-americano (CEPA), em Buenos Aires, Ubaldi, que nunca agiu como espírita e nem se considerou espírita, envia uma carta aos participantes do Congresso arvorando-se em reformador e atualizador do Espiritismo. Elabora várias críticas duras ao Espiritismo e oferece sua obra para que o Espiritismo não ficasse em estado “estacionário”.  Sobre sua própria obra, Ubaldi não se contém, e se auto-elogia, como havia aprendido com “Sua Voz”:
“Trata-se de uma teoria obtida, que permite caber dentro do Espiritismo, porque atingida por inspiração, ou intuição, considerada a mais alta forma de mediunidade consciente, controlada pela razão; usada como verdadeiro método de pesquisa”.
        Em primeiro lugar, Ubaldi não utilizou nenhum tipo de controle que pudesse ser tido como “verdadeiro método de pesquisa”. Em segundo lugar, o trabalho de Ubaldi consiste em uma complexa mistura daquilo que é atribuído à “Sua Voz” e aquilo que é do próprio autor encarnado, seja de origem paranormal anímica seja de reflexões conscientes. Quando ele diz “considerada a mais alta forma de mediunidade consciente”, resta dizer por quem é considerada, e quais as evidências científicas dessa opinião. Ubaldi claramente tem interesse em defender seu processo mediúnico e destacá-lo acima dos demais métodos de obtenção mediúnica, mas não demonstra empregar quaisquer métodos de controle, pois sua obra, sobretudo “A Grande Síntese”, era “irretocável”.

11)   Vale citar o artigo do confrade Alexandre Fontes da Fonseca, que, como professor-pesquisador de Física e estudioso da Doutrina Espírita faz uma análise crítica da obra “A Grande Síntese”, denominada “Um análise científica de algumas afirmações de “A Grande Síntese”, a qual foi publicada em “Jornal de Estudos Espíritas”. Esse autor afirma o seguinte, no resumo do respectivo artigo: “Afirmações científicas contidas na obra “A Grande Síntese”, de Pietro Ubaldi, são analisadas aqui com base em conhecimentos atuais da Ciência. O nível dos erros científicos e de interpretação dos conceitos da Física contrastam com a pretensão do autor espiritual de estar com a verdade. Isso mostra que a obra não tem valor científico”.
Também é importante lembrar, mais uma vez, que, para Pietro Ubaldi, a obra “A Grande Síntese” não seria obra sujeita a qualquer tipo de alteração. O que, por si só, já não é postura científica, ainda mais, se considerarmos que estudiosos tem demonstrado erros conceituais grosseiros no corpo do texto. Os erros de Física discutidos pelo artigo de Alexandre F. Fonseca ilustram isso.

Os estudiosos que se dispuserem a tentar ler algo da obra de Pietro Ubaldi perceberão uma obra carente de conteúdo, megalomaníaca, egocêntrica e vaidosa. Além de apresentar caráter autobiográfico, o texto de Ubaldi é prolixo, com excessivas adjetivações, em uma linguagem com estilo grandiloquente, empolada, que tenta convencer mais pelas frases de impacto e pelas repetições do que propriamente pelas suas informações.
A título de ilustração, vejamos algumas colocações da conclusão da obra “A Nova Civilização do Terceiro Milênio”, na qual Ubaldi utiliza expressões e comentários como: “inferno terrestre” (duas vezes); “Assim sou: apocalíptico contraste de aspirações e misérias”; “Meu espírito triunfa, mas o corpo está cansado”; “Em geral, devo bem pouco a meus semelhantes, que só me deram desgostos e sofrimentos”; “Senti em mim um desespero cósmico...”; “Por isso tudo, o conjunto da presente obra valerá mais pela tentativa que pelo que realmente foi feito”; “...este livro é uma ponte lançada para o infinito”, entre outras. Em suma, Ubaldi e/ou “Sua Voz” comenta excessivamente de si mesmo, de suas dores e de suas conquistas, em um processo constrangedor de auto-promoção, usando expressões sem clareza de sentido, buscando denotar um pseudo-profundidade filosófica, bem distante do que aprendemos com a objetividade e a didática do Mestre Allan Kardec.
Aparentemente, Pietro Ubaldi era um indivíduo que tinha realmente interesse em questões espirituais e apresentava, de fato, uma sinceridade nessa busca. Entretanto, somente essa predisposição positiva não foi suficiente para realizar uma obra consistente, em função do despreparo para lidar com o fenômeno mediúnico e com a avaliação do conteúdo da mensagem. Crendo ser um “Apóstolo”, sua vaidade, suas tendências católicas e sua excessiva credulidade o fizeram aceitar fanaticamente o que a sua intuição (ou “Sua Voz”) lhe trazia.

A leitura da obra de Ubaldi, dentro do amplo universo do Espiritualismo, poderia trazer alguma coisa de positivo para aqueles que ainda estão buscando familiaridade com temas como reencarnação e mediunidade. Entretanto, tal obra, assim como seu autor/médium encarnado, não pode ser considerada espírita e apresenta, à luz da Doutrina Espírita, diversos erros conceituais e metodológicos.

Leonardo Marmo Moreira